Boas práticas de manejo, bem-estar animal e ambiência estão diretamente ligados ao controle da geração de gases de efeito estufa.
Boas práticas de manejo, bem-estar animal e ambiência são aspectos fundamentais quando se trata de avaliar as emissões de carbono e a geração de gases de efeito estufa (GEEs) na suinocultura e na avicultura. A produção animal é uma atividade de alto impacto, tanto pelo grande volume de resíduos gerados quanto pela emissão de gases poluentes, odores e particulados, que podem causar poluição atmosférica e prejuízos para o bem-estar e saúde humana e animal.
Essas questões são alvo da atenção do criador de suínos Rodrigo Bisollo, de Seara (SC). Proprietário da AgroBisollo, composta por duas propriedades dedicadas exclusivamente à suinocultura e que totalizam 27 mil m² de área construída, ele conta que investe constantemente em tecnologias para garantir boas práticas de manejo, bem-estar animal, edificações adequadas e, ainda, sustentabilidade da atividade.
A atuação é voltada a Unidades Produtoras de Leitões Desmamados (UPDs), com entrega de 160 mil leitões por ano. Um dos investimentos recentes é a implantação de dois biodigestores – um deles já em funcionamento e outro em fase final de implantação – para transformação dos dejetos em biogás, contribuindo para o projeto de sustentabilidade das propriedades.
“Em nossas áreas, não temos outra atividade agrícola, portanto, os dejetos não eram utilizados como adubo. Então, arrendei áreas para depositá-los e isso tem um custo”, relata Bisollo, elencando, além do valor do aluguel, os custos com transporte.
Com os biodigestores, ele reverteu o gasto: “estamos transformando gás nocivo em renda”. A geração de energia para as duas propriedades ocorre por meio de paineis solares fotovoltaicos, geradores próprios e, agora, do biogás.
O produtor considera a implantação do sistema viável – quando se trata de propriedades maiores – e observa que o equipamento também possibilita ao proprietário ter conhecimento sobre a quantidade de gás gerada nos ambientes. “É um indicativo bem importante para a propriedade”, comenta. E completa: “além disso, atende a legislação e contribui com a natureza. Sem falar na economia, com a geração de energia, pois se a atividade não se paga, não é sustentável”.
Outra tecnologia que contribui para a redução de dejetos e, consequentemente, a diminuição da emissão de gases, segundo o suinocultor, é a automatização dos silos. “Custa caro, mas compensa”, garante.
Com bebedouros e comedouros mais eficientes, o manejo ganha em economia e praticidade, sem exigir muita mão de obra. Alimentação programada e água na quantidade correta para a nutrição e o conforto animal também diminuem o desperdício.
Bisollo cita ainda o sistema de reaproveitamento de água da chuva. Ele conta que todas as instalações contam com calhas e que atualmente 90% da água utilizada nas propriedades – para consumo dos animais e para limpeza – vêm do sistema. “Nossas granjas estão se tornando autossuficientes”, comemora.
As edificações da AgroBisollo são em alvenaria, construídas em concreto pré-moldado, com climatização e controle de iluminação, temperatura e umidade – o que ajuda na redução do consumo de energia e de água – e isolamento acústico.
O criador destaca o foco no bem-estar animal, desde a infraestrutura física de ponta, com dois ambientes controlados – para porcas e leitões -, até quesitos ligados à sanidade, nutrição, baias coletivas, inseminação otimizada, gestação em grupo, enriquecimento alimentar e ambiental (com uso de correntes para desestressar), programa de vacinação planejada, produção integrada, capacitação frequente dos funcionários, entre outros aspectos.
Para além das questões relacionadas ao controle das emissões de gases de efeito estufa, Bisollo ressalta a importância dos investimentos e melhorias, apontando como retorno mais qualidade e produtividade na suinocultura.
“É um ciclo e todos ganham, o suíno que é bem cuidado e o produtor que tem melhores resultados”, conclui Bisollo.
Boas práticas
Paulo Armando de Oliveira, pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, explica que as boas práticas de manejo visam o desenvolvimento adequado dos animais, evitando estresse, otimizando a produção e ajudando a reduzir a emissão de GEEs. Um dos pontos observados por Oliveira diz respeito à limpeza das edificações.
Segundo o pesquisador, os dejetos devem ficar, no máximo, 15 dias nas granjas. “Depois disso, começam a produzir gases e, com isso, haverá interferência negativa na produção animal”.
Oliveira também cita, no caso dos aviários, que o excesso de amônia pode levar a problemas graves nas aves, como cegueira. Assim como o excesso de CO2 pode “roubar” o ar da edificação, dificultando a respiração dos animais.
O pesquisador pontua que, muitas vezes, o bem-estar animal é dissociado das boas práticas. “Mas é uma cadeia que está entrelaçada, ou seja, se eu tiver um animal com ótima genética, com nutrição fantástica – porque hoje os centros de pesquisa definem o nível de proteína ideal para esse animal -, mas ele for colocado em um ambiente inadequado, tudo será jogado fora”, adverte.
Ele também chama a atenção para o fato de que somente agora começa a se dar importância à ambiência no Brasil. O termo está ligado ao conhecimento a às adaptações relacionadas às condições ambientais em que os animais são criados, incluindo iluminação, ventilação, temperatura, umidade, qualidade do ar, entre outros pontos referentes às instalações.
“É fundamental ter todos esses aspectos em ordem para então começar a medir a emissão de gases”, recomenda. Para ilustrar porque isso é importante, o pesquisador lista situações como quando a cama dos animais fica encharcada, em vez de seca: “é possível que se esteja medindo gases provenientes das camas e não dos animais. Se os dejetos ficam acumalados dentro da edificação por muito tempo, da mesma forma haverá produção de gases, principalmente metano”.
O projeto Rede BiogásFert, da Embrapa, enfatiza que nos sistemas em confinamento de suínos no Brasil, o manejo adotado em mais de 95% das granjas consiste no armazenamento do dejeto em esterqueiras para estabilização parcial seguido da aplicação no solo para fertilização de lavouras e pastagens. “Durante o armazenamento, os dejetos emitem principalmente o CH4 e NH3 e a sua aplicação ao solo resulta em um incremento na emissão de CO2 e N2O”, aponta a Rede BiogásFert.
O pesquisador Paulo Armando de Oliveira explica que a metodologia atual de medição de GEE segue o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas). “No Brasil, estamos começando a medir os gases agora. São poucas propriedades ainda que têm medidores e sensores de CO2 contínuo e de amônia. A gente tem um terreno muito grande pela frente”, considera.
Ele lembra que o Brasil trabalha na implantação de uma metodologia própria para medição de gases de efeito estufa, uma vez que o uso de uma tabela internacional “superestima a produção” dos GEEs. Oliveira acrescenta que se compararmos o nosso sistema produtivo – tanto de suínos quanto de aves -, nosso desempenho animal é muito melhor do que o da Europa.
“Temos clima tropical, nossa alimentação é milho e soja – eles têm outro tipo de alimentação. Então o nosso coeficiente de produção é, muitas vezes, melhor que o deles. E se a gente tem o desempenho melhor, ou seja, os animais absorvem mais os nutrientes, consequentemente a emissão de gases é menor”, enfatiza.
Tendências em edificações
Além das boas práticas de manejo e de bem-estar animal, algumas tendências em instalações físicas na suinocultura e avicultura ganham força e trazem tecnologias recomendadas também para o controle da emissão dos GEEs.
De acordo com Oliveira, edificações completamente fechadas, com isolamento térmico, controle de temperatura e umidade, e com cores claras na parte interna – que também contribuem para a redução do gasto com energia para iluminação – estão entre as características listadas.
Além da ética: bem-estar animal gera renda ao produtor
“Ao controlar o ambiente, não se tem mais interferência da temperatura externa. No caso da suinocultura, se estiver muito frio no Sul, os leitões sofrem, se estiver muito quente no Centro-Oeste, haverá problemas com as fêmeas e os animais pesados. E assim também com as aves”, observa.
“Quando trabalhamos na faixa de termoneutralidade, todo o alimento que o animal ingerir será para o seu crescimento e não para ele lutar contra o frio, para a geração de calor, ou do contrário, ficar sem comer porque está muito quente”, acrescenta o pesquisador.
A tendência já vem se solidificando nos aviários de agroindústrias país afora, assim como na suinocultura vem aparecendo nas novas construções. “É uma quebra de paradigma, há dez anos não se falava nisso”, completa.
O tema “As emissões de Carbono e os Gases de Efeito Estufa na produção de suínos e aves” foi abordado por Paulo Armando de Oliveira, pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, durante o Inovameat Toledo, realizado no início de abril, em Toledo, na região Oeste do Paraná. O evento colocou em pauta a inovação na produção de proteína animal e reuniu um público de aproximadamente 2.700 pessoas.
Fonte: https://globorural.globo.com/especiais/fazenda-sustentavel/noticia/2024/05/criadores-de-suinos-e-aves-buscam-reduzir-emissoes-de-carbono.ghtml